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Após as Polémicas sobre a Masculinidade Tradicional, Será que as Mulheres Ainda Precisam dos Homens?



A American Psychological Association (APA), permitiu a publicação de um artigo polémico acerca da “Violência e masculinidade prejudicial” (Harmful masculinity and violence), caraterizando o homem tradicional como algo perigoso à sociedade contemporânea. A ótica do(a) autor(a) anónimo(a) do artigo supracitado, sugere uma estrutura interpretativa transformativa, impulsionada pelo movimento pós-modernista feminista. Desta forma, o artigo ridiculariza, o que parece considerar, ser um modelo dinossauro/obsoleto da própria figura masculina. Da minha parte, incitou uma análise algo mais detalhada do que estes movimentos académicos burlescos, no espaço natural desta ‘espécie’ (homem tradicional) possivelmente em vias de extinção. Neste artigo irei explorar especificamente uma das dimensões mais importantes da vida desta criatura das cavernas, ou seja, o relacionamento amoroso, que gera o contrato explícito ou, como também amplamente conhecido, o matrimónio. Possivelmente também terei de falar do papel da mulher neste processo, apesar de não querer confundir estes movimentos (neo)feministas, ao considerar que a mulher opera realmente um papel importante nas dimensões do matrimónio tradicional e do psiquismo do homem.


O primeiro relacionamento psicológico do homem é estabelecido com a mãe. É a própria figura materna, que através do turn-taking irá modular a estrutura mental do infante. Numa primeira fase, através da amamentação cuidada, a mãe poderá transmitir a oxitocina (hormona associada à criação da empatia) e numa segunda fase, quando o infante ganha uma consciência coerente, uma mãe atenciosa poderá responder efetivamente às necessidades do bebé. Ao longo do desenvolvimento, outros fatores poderão melhorar ou piorar essa relação. Inevitavelmente, certos elementos tornar-se-ão conscientes e, caso sejam positivos, irão impulsionar o rapaz a procurar uma rapariga semelhante à sua mãe. Outros elementos poderão ficar na esfera inconsciente, assim, por muito boa que uma mãe seja, se o seu matrimónio não é positivo, de forma a não perturbar as aparências de um relacionamento saudável com o marido, ela poderá inconscientemente prender o seu filho, tornando-o quase como substituto do seu marido. Este rapazinho, possivelmente emaciado da sua constituição masculina, invariavelmente, poderá procurar uma mulher tirânica e arrogante, que de certa forma o poderá romper do seio materno onde continua adormecido.


A vida é complexa, mas nada é tão claro relativo a esta necessidade, que até a Eva (bíblica) enquanto mulher, não tolera um homem ‘adormecido’. Desta forma, Eva partilha o fruto da transformação com Adão, tornando-o consciente de si mesmo. É daí que surgem as batalhas das sogras com as noras, onde as segundas, pretendem transformar o beta (filho) em alfa (marido). Consequentemente, o mulherengo pode abandonar o poliamor, para se amar a ele próprio e descobrir-se como homem. A mulher (mais especificamente o feminino enquanto categoria abstrata) que simboliza o caos, simboliza também o mundo novo, a oportunidade, a descoberta então, do homem, em si mesmo. Resumindo, o outro revela um elo fundamental para a expressão da consciência, mas também para a elação do material inconsciente. É quando o outro nos perturba exacerbadamente, que ganhamos consciência de todos os elementos que estão até ali ocultos. É quando o ou a amante sentem ciúmes, que descobrem um amor que não é tão liberal, pois o vínculo traçado é muito mais profundo do que o simples desejo carnal. Portanto, a busca do outro não é involuntária e ele(a) encontra o que procura e descobre o que nem pensa procurar. Até aqui fica explícito que o homem precisa mais da mulher, do que propriamente a mulher do homem. Dando ênfase ao velho provérbio ‘atrás de um grande homem, está sempre uma grande mulher’, talvez maior ainda.


Ao mesmo tempo, o homem é tão preciso como símbolo masculino, assim como a mulher é tão precisa como símbolo feminino nesta demanda. O artigo referido anteriormente afirma que traços tais como o estoicismo, agressividade, dominância e arrogância são destrutivos para a figura masculina. Na verdade, eles não são só necessários para o homem nas várias dinâmicas da sua vida, como também podem ser apelativos para a mulher. Tirando homens cujo carater inato e a dinâmica da vida apela à sensibilidade emocional, alguns homens têm de enrijecer entre trabalhos duros, que só são praticáveis com uma robustez cognitiva, que não permite propriamente divagar sobre a estética da betoneira. Relativamente ao aspecto apelativo desses traços, convém mencionar o estudo de Jonason e colaboradores em 2012. Neste estudo, também publicado na APA, os autores abordaram a tríade negativa da personalidade na pop culture, realçando a sensualidade destes traços nos anti-heróis masculinos. De certa forma, nós não necessitamos de observar somente estes traços em agressores e violadores. Em certa instância, desde James Bond, passando até pela figura do Batman, como mais recentemente personagens incorporadas por Jason Statham, Vin Diesel, ou David Duchovny em Californication, revelam-se atraentes por esses mesmos fatores. São traços importantes, porque a mulher não se sente somente segura e valorizada por ser a escolhida, como poderá sentir o mesmo relativamente aos filhos do casal.


De forma complementar, não é somente a mulher que ‘educa’ e civiliza o homem, apesar da necessidade dela nesse processo. Na dança do matrimónio psicológico, os passos são traçados por ambos. Desta forma, a firmeza do masculino sustém as acrobacias velozes e ansiosas do feminino, assim como a mulher requinta a robustez crua e austera do homem. Esta dinâmica arquitetural não é atípica às outras formas de arte, já que aos elementos basilares do homem (fálicos) deve ser acrescentado o arco quebrado feminino. Tal como na arte gótica, os arcos instáveis ao oporem-se fortalecem-se. A vida conjugal pode inclusive ser caótica nos devidos momentos. Essa esfera de tensão é necessária para própria evolução matrimonial. A partir dos erros vêm as aprendizagens. Entre dois seres opostos os erros são mais propícios. Contudo, os opostos atraem-se e mais do que isso complementam-se. Por isso, não devemos ter a pretensão de os assemelhar, como algumas correntes pretendem fazer.



Algures no seu livro Mulheres livres Homens livres, Camille Paglia afirma que

“o feminismo americano tem um problema com os homens. Tanto as que se reveem nas imagens sorridentes das apresentadoras da revista de culinária Betty Crocker, pãezinhos sem sal com olhos de carneiro mal morto, como muitas outras do mais puritano e provinciano que há, chamam a si próprias feministas, desejando que os homens sejam como as mulheres. Temem o homem e ao mesmo tempo desprezam-no. As teóricas do feminismo estão convencidas de que os seus maridos, ratos de biblioteca isolados da realidade, representam o modelo ideal da masculinidade.”

Eu adiciono que algumas mulheres motivadas por estes complexos, não só desprezam o homem, como desprezam também a mulher que consegue ser independente dessas motivações - ternurenta, carinhosa e que gosta deste tipo de homem. Existem sim homens mais masculinos e efetivamente existem os homens mais femininos, um tipo não poderá negar necessariamente o outro, como alguns movimentos o pretendem fazer. Nem eu pretendo menosprezar a beleza da existência de um em deterioramento do outro.


Sem me estender longamente no artigo, o matrimónio representa muito mais do que uma mera tendência no nosso país após crise. Ele pode ser uma necessidade de complementaridade entre duas psiques. Contudo, defendo, a posição de Suzanne Venker, que a APA acaba por tornar mais difícil manter casamentos fortes. Afinal, como ficará a imagem destes homens mais masculinos? A ação de associações tão poderosas como a APA, não só distorcem a realidade, como também podem influenciar a própria conduta da sociedade. Não acredito que a modifiquem realmente, mas podem nutrir grupos coletivos neuróticos que irão perturbar a dinâmica saudável da sociedade e das relações conjugais (futuros matrimónios), que ainda não ganharam o devido calo conjugal.


Concluindo, tal como Anthony Stevens explica no seu livro Archetype Revisited, a influência do feminismo radical é em parte culpada por isso,

“por causa da energia que colocou na estigmatização do casamento como ‘patriarcal’, como uma licença para o abuso de cônjuges, e como sendo inimiga das mulheres na força de trabalho”.

Ao longo da minha parca experiência enquanto clínico tenho percebido que, tanto o homem como a mulher, devem responsabilizar-se pelo papel conflituante do seu matrimónio psicológico. A implicação prática destas ‘teorias’ feministas radicais, é enfatizar o exercício de apontar o dedo ao outro, em vez de considerar o todo. O todo não representa somente o papel do outro. Representa o papel que eu desenvolvo e o qual permito que o outro desenvolva também. O verdadeiro empoderamento deve emergir de dentro e não às cavalitas de um alvo. O silêncio sobre determinado tema não representa um vácuo inexistente, é antes a escolha de uma possível conduta que poderá alimentar a expressão do outro. Cabe, portanto, aos psicólogos perceber de que lado do oceano pretendem ficar e aos restantes grupos de investigação debater este fenómeno/crise bastante atual.

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